quinta-feira, 29 de julho de 2010

Rubro Negro #13 - Episódio Final - O Dia do Copiador


No aeroporto Santos Dumont, à noite, um avião chegava trazendo um passageiro singular. Cabelos curtos, raspados, olhos castanhos, barba rala. Traços árabes. Vestia camisa branca de botão e um casaco marrom por cima. Obviamente não estava preparado para o calor do Rio de Janeiro. Assim que desembarcou, foi surpreendido por uma mulher armada e outros homens. Todos vestiam roupas militares, mas com traços diferentes. As pessoas se assustaram e abriram caminho.
- Parado aí. Não tente nenhuma gracinha. – a mulher apontou seu fuzil para o árabe. Os outros mostraram suas armas apontadas. Ninguém entendia nada. Então, o homem sorriu e apertou um botão em sua mala. Um projétil metálico de 30 centímetros foi disparado e atingiu o chão em volta daqueles homens armados. Uma grande fumaça os deixou surpreendidos.
- Não deixem ele escapar! – gritava a mulher, em vão.
Correndo, o árabe subiu as escadas. Aproveitou a fumaça que se espalhava para sua furtividade. Subitamente, aparência se modificou. Ele não era mais um árabe, mas um homem de pele negra e cabelo raspado com roupas de taxista. Desceu pelas escadas pelo outro lado do aeroporto e foi até um táxi. O abriu e deu partida, sob protestos do dono que estava vendo a confusão dentro do aeroporto.
- Ele não foi muito longe. Chame o furgão. – a mulher disparava ordens ao seu comunicador portátil preso à cabeça, um ponto no ouvido e um microfone.

Rubro Negro estava na Avenida Presidente Vargas, seu local favorito para patrulhar. Sempre tinha um grupo de palhaços que insistiam em assaltar por ali ou uns policiais que vendiam drogas. Entretanto, ele viu um táxi desgovernado e perseguido por um furgão negro e sem identificações.
- Isso vai dar merda.
Rubro Negro correu pela rua e cortou por um atalho. Viu o táxi passar à sua frente e se jogou no teto. O motorista se assustou e quase perdeu o controle do carro e acabou dobrando na Avenida Trinta e Um de Março em direção ao Sambódromo.
- O carnaval é só ano que vem. Diminui aí! – disse Rubro Negro, mostrando sua cara pela janela do carona. Antes que o motorista pudesse responder, os homens no furgão logo atrás surgiram das janelas com fuzis. Atiraram pelo carro inteiro. Rubro Negro foi atingido no braço, mas ignorando sua dor, pegou o motorista pela gola da camisa e com um puxão, o tirou do táxi. Ele saltou para a rua usando sua força para controlar a queda e cair de costas para proteger o motorista. O carro continuou seu percurso e bateu numa loja fechada. Havia uma pequena multidão se aglomerando em volta dos dois. O furgão dobrou a esquina, aparentemente indo embora.
- Tu tá bem, cara? – Rubro Negro se erguia do chão colocando as mãos nas costas raladas. As pessoas à volta se dividiam entre vaiar e aplaudir o vigilante mascarado.
O homem saiu entre a multidão correndo e atravessou a rua sem dar nenhuma explicação. Rubro Negro tentou segui-lo, mas o perdeu de vista.
“Como ele pôde ter corrido tão rápido assim? E quem eram aqueles que o perseguiam?” Com essas dúvidas na cabeça, Rubro Negro encerrou suas atividades naquela noite.

No dia seguinte, Arthur saía de sua aula no Fundão já sonhando com o retorno das obras do IFCS quando viu Sofia lendo um livro, sentada enquanto bebia um refrigerante. Ele se sentou ao lado dela com um sorriso largo.
- Bom dia, mocinha. – tentava ser agradável, sabendo que ela ainda estava brava com ele.
- Oi. – Disse ela, seco.
- Sei que tu tá irritada comigo, mas...
- Não tô nada. Não me importo. – séria a cada palavra. Arthur engoliu seco.
- Olha, eu sei que fiz besteira e...
- Se sabe, então por que está aqui falando comigo? – ela virou o rosto para ele, irritada.
- Porque eu quero consertar as coisas. Mas existem certas coisas que não posso falar e...
- Então, nem perca seu tempo. – Sofia se levantou decidida e saiu pisando firme. Pegou seu carro mini-coopper esverdeado e foi embora. Arthur deu um tapa na própria testa.

À tarde, Arthur saiu do Fundão e se dirigiu para a Biblioteca Nacional por sua leitura em dia. Sentia bastante preguiça naquele meio de período na faculdade, mas não podia bobear, pois as provas estavam chegando. Passou por uma loja onde vendiam televisões de alta tecnologia e acabou vendo a notícia de que os líderes da América Latina se reuniriam naquela noite num grande evento social. No dia seguinte, os líderes do Mercosul iriam se reunir na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro.
“Que beleza, heim. Presidentes vão falar um monte de baboseiras inúteis. Nunca irão pensar nas questões populares mesmo. Vão decidir quais melhores meios de seus mercados evoluírem...”
Nesses pensamentos, Arthur entrou na Biblioteca. Á noite, vestiu seu traje de Rubro Negro e subiu no alto do prédio da Embratel. Foi então que ouviu um barulho de motor se aproximando do céu. Olhou e viu um homem trajando uma armadura azulada que cobria todo seu corpo com asas metálicas que pareciam de um jato. Ele pousou há poucos metros de Rubro Negro. Seu capacete parecia de um piloto de caça.
- Saudações, Rubro Negro. – dizia uma voz abafada por meios eletrônicos. Antes que ele falasse alguma coisa, o homem continuou.
- Eu sou Alpha Azul, membro da Ação Secreta de Proteção, a ASP. Tenho um assunto para tratar com você, o vigilante do Rio de Janeiro.
- Nossa, desde quando agências secretas vêem falar comigo assim? E desde quando alguém acha que eu não sou um bandido? – Rubro Negro estava desconfiado. Naquele ano ele havia enfrentado tantos homens trajando roupas diferentes com habilidades diferentes, mas que tinham algo em comum: eram loucos ou criminosos.
- Entendo sua desconfiança. A mídia e uma parcela da população não gostam de você. Mas nós monitoramos suas ações desde o seu início, ano passado. Não usamos os jornais para fazer juízo de seu caráter. Sabemos que tem boas intenções. – Rubro Negro ficou sem palavras, desviando o olhar, mas agora por timidez.
- Continuando. Como você deve estar sabendo, os líderes do Mercosul irão se reunir amanhã de manhã para selar acordos que serão de benefício para seus países. Inclusive o Brasil. Daí nós entramos.
- Espera aí. Vocês são de uma agência brasileira? Difícil acreditar...
- Nós somos internacionais, agimos em todos os países e eu sou o representante brasileiro. Nossa jurisdição é global. Mas intervimos onde há ação de super-seres e outros assuntos sobrenaturais. No Rio de Janeiro, nós não intervimos porque acreditamos que você e outros estão fazendo bem o serviço de manter a vida social dentro da normalidade.
- Outros? Existem outros malucos como eu com máscaras e super poderes?
- Isso não é importante. O que importa é que hoje nós precisamos de sua ajuda. Chegou ao aeroporto hoje de manhã um homem com um grande poder sobrenatural. Ele é conhecido pelo submundo internacional como o Copiador. Seu poder é de copiar super-poderes. Ele é um mercenário perigoso e quer dar um fim à vida dos presidentes latino-americanos.
- E como eu posso ajudar nisso, afinal?
- Ele deve estar nessa reunião social hoje a noite e tentará fazer alguma coisa. Nossos equipamentos se demonstraram ineficazes em detectar sua presença. Ele é invisível às máquinas, por isso precisamos que você o vigie o prédio em que acontecerá o evento.
- E se eu o vir? Eu salto em cima dele?
- Não faça nada, apenas nos chame.
- E onde você estará?
Alpha Azul ficou uns segundos em silêncio antes de responder.
- Segredo. – mais irônico impossível.
Rubro Negro recebeu um botão que prendeu no peito. Bastava apertar que ligaria um sinal e chamaria Alpha Azul. Ele ainda pediu uma carona para voar até o Copacabana Palace Hotel, onde estavam os líderes do Mercosul, mas Alpha Azul disse que era melhor manter a furtividade e que ele chamava muita atenção voando.
Dando de ombros, Rubro Negro foi correndo mesmo.

As horas se passavam e Rubro Negro ficou absorvendo as informações que recebeu de Alpha Azul. “Então, quer dizer que existem outros super-seres além dos que eu já combati? Esse mundo está cada vez mais louco. E quem serão esses caras com super-poderes que também são heróis? Como conseguem se manter no anonimato nesses dias.” Pegou um jornal velho e viu sua foto, a luta contra o Cruz de Malta, meses atrás. A manchete não era nada interessante: “Aberrações destroem centro da cidade”.
Súbito, ele viu em cima de um prédio da Avenida Nossa Senhora de Copacabana, um homem trajando roupas negras, jaqueta de couro negra e uma máscara que ocultava o rosto inteiro e também negra com óculos escuros. Ele deu um super-salto e pousou no terraço do Copacabana Palace. Rubro Negro apertou o botão em seu peito. Ele piscou por alguns segundos e depois apagou.
- E agora? – quando voltou os olhos para o terraço, ele não estava mais lá. – Merda!
Rubro Negro pegou distância do prédio onde estava, sobre a Churrascaria Palace, e saltou para o terraço. Quase caiu na rua, mas conseguiu agarrar-se no alambrado. Subiu e correu para a porta de que desceria com escadas até os andares do hotel. Entretanto, ao abrir a porta, deu de cara com o homem de negro mascarado.
- Peguei você – disse o Copiador.
Com um soco no estômago, Rubro Negro cuspiu sangue. Dobrou-se para frente, sentindo dores incríveis. De relance, viu seu adversário com as mãos feitas de pedra.
- Deve ser muito difícil ir ao manicure, não é, sua bicha?
- Idiota.
Copiador ergueu as mãos e apontou para o Rubro Negro. Disparou uma rajada de energia de plasma, idêntica ao de Rubro Negro. Atingido, ele foi jogado para trás, caindo no chão.
O Copiador correu para cima do herói mascarado e desferiu um chute visando sua cabeça. Entretanto, Rubro Negro desviou e deu um soco no queixo, aproveitando o movimento para erguer-se do chão.
- Seus poderes são meus poderes agora. Raio de plasma, não é? Interessante. O que mais você tem?
Antes que o Copiador e Rubro Negro continuassem a lutar, a porta se abriu atrás deles. Era uma mulher e outros homens vestindo roupas de gala e portando armas avançadas. Certamente eram agentes infiltrados. A saraivada de tiros atingiu a ambos. Rubro Negro e Copiador rolaram para direções opostas do terraço.
- Ei, um pouco de cuidado aqui, heim!
- Dois alvos atingidos, mas precisamos de reforços. São muito poderosos. – A mulher soltava ordens pelo rádio-comunicador. Rubro Negro não entendeu nada. Ele era um alvo também? Não estava ajudando aquela agência secreta?
Antes que se pudesse fazer algo, o Copiador disparou uma rajada de plasma que destruiu uma caixa d’água. Todos foram, então, banhados e arrastados pela forte correnteza. Copiador apenas saltou para outro prédio, sem dificuldades. Rubro Negro se levantava, já preparando uma corrida para saltar e iniciar a perseguição, quando fora atacado pelos homens. Eles usaram algemas que nem mesmo Rubro Negro conseguiu arrebentar.
- Você está preso, Rubro Negro. – a mulher apontava uma arma em sua cabeça, enquanto os homens o mantinham de joelhos.
- Está acontecendo um engano aqui. O Alpha Azul me pediu ajuda e...
- Ele fez o que? – a mulher pegou o botão de sua camisa, com o símbolo da ASP.
Antes que a situação se agravasse, eles ouviram um motor de jato. Alpha Azul pousou ao lado deles. A mulher andou determinada até ele com semblante feroz.
- Você deu o botão rastreador para Rubro Negro? Não sabe que são contra as ordens? – ela apontou o dedo, ofensiva.
- Acalme-se, tenente Maria Nascimento. Rubro Negro é confiável.
- Rubro Negro pode não ser ameaça, mas ele não pode se envolver nos assuntos da ASP. Não foram essas as ordens que tivemos.
- Eu sei disso. Mesmo assim, o Copiador é muito perigoso para nós sozinhos. Rubro Negro será de grande ajuda.
- Alpha Azul, eu entendo que não concorde com algumas ordens da alta cúpula, mas precisamos obedecer para que haja coerência em nossas ações. Se seguirmos nossas ideias e rebelarmos contra a hierarquia, viveremos em anarquia.
- Eu posso falar? – Rubro Negro mostrava um sorriso amarelo para eles, ainda ajoelhado e algemado. – O Copiador fugiu. Se não tivessem me prendido, eu poderia tê-lo alcançado. – Todos olharam para ele. Ele sorriu de volta. Era verdade.

Madrugada, Arthur não deu as caras em casa, mas avisou aos pais que dormiria na casa de um amigo. Na verdade, ele estava como Rubro Negro e em uma nave planando acima das nuvens do Rio de Janeiro. Era a sede da ASP. Era uma nave tão grande que poderiam caber muitos jatos. A tecnologia do local era espantosa.
Estava ele, Alpha Azul, tenente Maria e um monitor com a imagem de vários chefes da agência. Eles falavam cada um em seu idioma e um tradutor comunicava à Rubro Negro. Depois de horas, ficou resolvido que Alpha Azul seria punido por ter recorrido ao Rubro Negro para uma missão secreta.
- Eles são conservadores demais. Burocratas, não querem dividir a informação e o conhecimento para heróis vigilantes como você. Nessa luta, quanto mais nos unirmos, melhor. – dizia Alpha Azul quando lhe retiravam a armadura.
- Eu sou Rogério Platz. Prazer. – estendeu a mão e Rubro Negro cumprimentou. Ele era um homem magro, alto, com cabelos negros, lisos e bem cortados. Tinha um nariz fino, cumprido e olhos castanhos.
- Rubro Negro. – sorriu o vigilante mascarado em resposta.
- Nos encontraremos em breve. Aguarde.
Rubro Negro deu de ombros e foi solto, às cinco da manhã, na Praia do Flamengo. De lá, ele se dirigiu para casa, pensando em uma desculpa para não dormir na casa de um amigo e voltar naquela hora para casa. Quando parou de repente.
“O que eu tô fazendo? Um bando de engravatados que se acham donos do mundo me mandaram ir pra casa e eu tô obedecendo? Ora, Rubro Negro, que vergonha de você. O mundo pode ser a jurisprudência deles, mas no Rio de Janeiro quem vigia sou eu.”
Sendo assim, ele deu meia volta e correu para a Assembléia Legislativa.

A imprensa estava toda lá, tirando suas fotos nas escadarias da Assembléia. A polícia comum estava nas cercanias do bairro e a polícia especial estava cuidando do perímetro do prédio. A Assembléia Legislativa recebeu, em carros-chefes cumpridos como limusines, os presidentes latino-americanos.
Assim que todos entraram e se postaram em seus lugares para o início da reunião daqueles líderes, Rubro Negro surgiu do nada, como se sempre estivesse ali presente. Todos olharam assustados para ele.
- Morram.
Entretanto, antes que ele fizesse alguma coisa, a tenente Maria e outros homens da ASP à paisana pularam sobre ele com as algemas. Rubro Negro usou sua super-agilidade para se desvencilhar de seus agressores e os jogou para todos os lados. A policia especial do Rio de Janeiro entrou em ação e atirou, enquanto os presidentes eram protegidos por seus seguranças. O caos estava instaurado na Assembléia Legislativa. Ninguém era páreo para o Rubro Negro.
Exceto o verdadeiro.
Rubro Negro destruiu o teto do prédio da Assembléia com sua rajada de plasma. Desceu com as duas mãos unidas desferindo um grande soco na cabeça de Copiador que estava com seus poderes.
- Tu deve ter baixa auto-estima para ter que imitar o inigualável Rubro Negro! – aproveitando o momento atordoado de Copiador, Rubro Negro desferiu um chute nas suas costelas e um soco em seu rosto.
Ninguém entendia nada. Dois Rubros Negros? Quem era o verdadeiro? A tenente Maria fez o sinal para não atirarem, concentrou seus esforços na retirada das pessoas daquele lugar. A polícia especial não sabia do envolvimento de outra entidade, mas receberam ordens de seu alto escalão para se retirarem também.
Rubro Negro recebeu um soco no pescoço de sua sósia. Afastou-se um pouco, tossindo. Antes que se recuperasse, Copiador desferiu uma rajada de plasma. Como reação, Rubro Negro disparou também. O choque das duas energias destruiu as cadeiras em que os políticos se sentavam para aprovar leis. As energias se mantinham constantes, com ambos os lutadores concentrados nelas.
- Nenhuma cópia é melhor que o original. – Rubro Negro, entre dentes rangidos, usou toda sua força e descarregou uma carga de plasma maior e sobrepujou o poder copiado do Copiador. Ele foi atingido e jogado contra a parede onde perdeu a consciência. Antes que ele pudesse usar a regeneração de Rubro Negro, tenente Maria e seus comandados surgiram para usar as algemas especiais.
- Não tem nenhuma dessas pra mim não?
- Fique na sua, ou sobra pra você.

Horas depois, Rubro Negro tirou sua máscara em casa, pois havia desistido da aula e dos estudos da tarde. Iria dormir um pouco. Viu que sua mãe e seu pai viam as notícias de última hora: “Rubro Negro faz atentado terrorista na Assembléia Legislativa no encontro do Mercosul”. As coisas voltavam ao normal.
Depois dessa, decidiu que era hora de lavar seu uniforme, todo sujo. Mexendo nele, encontrou um botão preso na bota. Era da ASP. Arthur lembrou das palavras de Alpha Azul e deu um sorriso.

FIM DA PRIMEIRA TEMPORADA.

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